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O ÍDOLO


Jefferson: a personificação de um ídolo

Segundo o dicionário, a palavra ÍDOLO significa "figura, estátua que representa uma divindade que se adora. Pessoa à qual se prodigam louvores excessivos ou que se ama apaixonadamente. Diz-se de certas figuras que desfrutam de grande popularidade".


É bem verdade que ídolos não se fabricam em laboratórios. Muito menos são inventados sem alguma razão. O processo de construção de um ídolo é mais complexo do que o nome, por vezes banalizado, indica. Ser um espelho passa pelas atitudes desta pessoa, primordiais para que a idolatria se estabeleça. Jovens que estão em plena formação de caráter e personalidade passam a olhá-lo como referência. A pressão de transmitir bons exemplos em cada ação é outro fator que merece atenção. Com isso, normalmente o fã o enxerga como alguém inatingível, espécie de ser de outro planeta. Desmitificar tudo isso, sendo acessível e afável, também é uma das etapas importantes para trilhar o caminho de grandes figuras.

Todo esse padrão traçado acima tem como intuito falar de um personagem muito especial, principalmente para o torcedor botafoguense. Jefferson, goleiro titular do Botafogo e presença constante na Seleção Brasileira, é um exemplo raro nos dias atuais. Na última semana, ele ultrapassou a incrível marca de 400 jogos com a camisa 1 do clube da estrela solitária. Ratificando sua postura de ídolo, declarou o desejo de alcançar a partida de número 500 com o traje preto e branco. Se tudo ocorrer como o esperado, ele terá tempo de sobra para alcançar - e até superar - a marca. Aos 32 anos - e único remanescente do elenco de 2015 que disputou a Série B na década passada (2003) -, o paulista de São Vicente é o maior ídolo da história recente do alvinegro. Cria das categorias de base do Cruzeiro e lançado por Felipão no clube celeste, transferiu-se para o time carioca como reserva do pouco confiável goleiro Max, alcançando a titularidade no ano seguinte e permanecendo em General Severiano até 2005. Se aventurou no futebol turco até 2009, quando retornou ao Botafogo na reta final da temporada ganhando um salário semelhante a de um jogador das categorias de base. Contrariando os prognósticos, ajudou o clube a se livrar do rebaixamento no Brasileirão com grandes atuações e passou a ser um nome respeitado em território nacional novamente. Chega 2010, o ano da sua afirmação. Goleiro arrojado e sabedor de sua importância, Jefferson começa a ser reverenciado pelo supersticioso torcedor alvinegro. Quem diria que, tempos depois, sua imagem estaria gravada no famoso muro localizado em frente à sede de General Severiano, no qual os seletos ídolos da história do Glorioso são eternizados em forma de arte?


"O melhor goleiro do Brasil!"

Há outros exemplos de jogadores idolatrados pelo mundo afora, é claro. Falando especificamente sobre os goleiros, a lista conta, obrigatoriamente, com os nomes de Rogério Ceni, Marcos, Buffon e Oliver Kahn. Jefferson, ou "Black Jeff", já é merecedor de integrar o seleto grupo. Ainda no começo da temporada, a decisão de permanecer no Botafogo para a disputa da segunda divisão foi digna de aplausos - e veneração por parte dos alvinegros, tão carentes por um representante dentro de campo. Em frangalhos, o clube devia mais de R$ 2 milhões para o arqueiro, e o assédio de várias agremiações era intenso, com o Santos forte na disputa pelo jogador. A novela teve final feliz e o Paredão decidiu permanecer para continuar escrevendo sua bela história no alvinegro. A atitude louvável mostra como Jefferson é um ponto fora da curva no futebol contemporâneo. Há quanto tempo não víamos o coração ser colocado à frente das cifras no famigerado universo da bola, na maior parte das vezes pautado por oportunistas e mercenários? 

Dentro das quatro linhas, o episódio mais marcante dessa relação intensa de amor entre o goleiro e os botafoguenses aconteceu na final da Taça Rio de 2010, em um Maracanã lotado. Botafogo e Flamengo duelavam pelo caneco, que, para o alvinegro, significaria o título direto do Campeonato Carioca. Era também a chance de finalmente por fim à sina de vice-campeonatos contra a equipe da Gávea. Quando o placar apontava 2 x 1 para o time comandado por Joel Santana e tudo se encaminhava para a festa em preto e branco no Estádio Mário Filho, o volante Fahel puxou Ronaldo Angelim na área e o juizão não teve dúvidas: pênalti para o Flamengo (quase um pleonasmo). Momento ideal para o ídolo aparecer. O do lado vermelho-e-preto se fazia presente. Adriano, o Imperador, colocou a bola na marca da cal para realizar a cobrança e recolocar o Rubro-Negro no jogo. Na meta adversária, um concentrado Jefferson tramava em seu pensamento tudo o que iria acontecer em segundos naquele local. O êxtase na arquibancada preta e branca mostrou o que a defesa magistral do ex-palhaço de circo representou. Com a ponta dos dedos, o arqueiro mudou sua história no clube e garantiu o torneio para o Fogão. A partir desse instante, Jefferson passaria a um outro patamar. Tapete vermelho estendido para o seleto hall de ídolos do Glorioso .



Ainda sobre atitudes apreciáveis e um tanto quanto incomuns em tempos de relações frias e indiferentes, a revista Placar produziu uma matéria muito bacana sobre o ídolo alvinegro (http://placar.abril.com.br/materia/jefferson-a-estrela-solitaria-do-botafogo/) e trouxe à tona uma história tocante. Daniel Augusto Cypriano, detento da Penitenciária de Segurança Máxima de Francisco Sá, em Minas Gerais, enviou uma carta à redação na qual Jefferson é, incrivelmente, um dos protagonistas. Segue o inesperado relato:


"Estou preso há 11 anos. Cumpro uma pena de 81 anos por assaltos a bancos e carros-fortes. Estou no RDD, o Regime Disciplinar Diferenciado. Não tenho TV nem rádio. Só podem entrar livros e revistas. É na PLACAR que acompanho o Cruzeiro, meu time de coração. Antes, estava na [penitenciária] Nelson Hungria, em Contagem (MG), a mesma do ex-goleiro Bruno. Gosto de goleiros: eu já havia mandado uma carta para Jefferson, do Botafogo.

Tentei fugir uma vez: com um revólver 38, rendi um agente e uma professora. Tentei pular o muro, mas não consegui. Virou a maior rebelião daquele presídio. No mesmo dia em que era transferido para a segurança máxima recebi a resposta de Jefferson. Ele me mandou uma Bíblia e uma camisa autografada. Disse para ler João, capítulo 8, versículo 32: 'Conhecereis a verdade, e a verdade o libertará'. Aquela foi uma resposta Padrão Fifa. Jefferson acreditou em mim. Em pleno Campeonato Brasileiro, ele tirou um tempo para me responder. Suas palavras mudaram minha vida: larguei o crime. Não fosse Jefferson, poderia ter morrido em uma nova fuga.”


O Redentor, segundo a Revista Placar

O ato descrito por Daniel é sublime. Sensibilizar-se com a vida do próximo vale muito mais do que defender um pênalti cobrado por Lionel Messi. Meticuloso, Jefferson tem essa consciência. É um ídolo nato, sabedor de suas responsabilidades. O botafoguense não consegue descrever o amor que sente pelo seu capitão. O torcedor brasileiro, no geral, o respeita demais e aprecia o sucesso do até outrora titular da equipe comandada por Dunga. Este texto em especial tenta mostrar como a construção de uma figura respeitável no mundo da bola, e fora dele, depende de ene fatores e requisitos. O camisa 1 alvinegro atende a todos eles. A relação de ternura infindável mantida com o torcedor é recíproca. Em sua essência, o apaixonado por futebol precisa adotar para si um jogador que personifique o clube para o qual ele torce. Jefferson assume essa posição e bate no peito. É motivo de respeito inclusive do adversário. Mais que isso, é um exemplo fiel de que vale a pena apostar em relações duradouras, um papo pra lá de careta nos dias de hoje. Um autêntico românticoque vai na contramão dos que beijam um escudo diferente a cada 12 meses - ou até menos.

Suas atitudes transcendem as quatro linhas, e fazem dele uma figura carismática e admirada, do Oiapoque ao Chuí. 
E há quem diga
que "é só futebol". 

Quando vão aprender?
Trate de ensiná-los, querido 
Jefferson.
Parabéns por ser tanto.

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